Dançar é...
Clevane Pessoa de Araújo
Dançar é escrever com o corpo jogar-se em absoluta confiança
no espaço estendido á frente,
alongar-se, encolher-se,
rodopiar,
inclinar-se.
no Outro que a(m)para,
depois de centenas de ensaios...
Dançar é tocar música
com gestos, com os pés,
absolutamente sem voz,
na arrasadora maioria das vezes.
Dançar é interpretar com meneios
e oscilações impressionantes
ao nosso olhar surpreso,
pois temos os pés no chão,
as nuances da mensagem, do enredo,
da palavra em das formas desenhadas
no espaço...
O corpo é o instrumento dos dançarinos:
suas mãos-libélulas,
suas mãos- borboletas,
suas mãos-colibris
escrevem versos no ar...
Seus pés com centenas de micro-fraturas,
seguem intinerários
que a cada instante
recomeçam
e recomeçam,
e se repetem...
A coluna é de borracha, de látex, de seda...
Curva-se, ancaixa-se, projeta-se.
e como dói, mas que importa,
se é o centro do soma?...
O rosto parece cheio de luz
e não revela os sofrimentos
nem os cansaços...
Há um sol em cada um dos olhos, às vezes, um luar de ouro,
pois sempre brilham de prazer,
no vício sagrado
impossível de desfazer
Já vi balerinos em cadeiras de rodas,
cada célula a vibrar,
como se fosse um palco
particular.
Já os vi com próteses de celulóide, em pleno vôo...
Já vi os que não mais podem
bailar, tornarem-se mestres,
para que os Outros possam dançar por eles...
Que magnífica mensagem vemos nas sapatilhas
esfarrapadas e disformes,
que foram um dia de superfície lisa e brilhante,
cetim e forma...
Quantos já dançaram com pés sangrando,
joelhos inchados, microfraturas?
Quantos choravam lutos e perdas
enquanto sorriam?
O dançarino é feito de retalhos dos deuses,
lançados pela Terra,
para que não possam ser esquecidos
em sua divindade...
O dançarino tem um pouco de ave e de borboleta
ou libélula, ou pluma, ou floco de algodão,
ou pétala, ou palha ,
a dançar na luz...